quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Na mão do sambista!

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Foi com muita alegria que recebi a notícia de que o CD com os sambas-enredos para o carnaval de 2010 seria gravado ao vivo, executado com a bateria de suas respectivas agremiações no palco da cidade do samba. Isto representa um grande avanço para que o público volte a reconhecer em disco as distinções musicais que cada bateria apresenta.
Embora os discos anteriores apresentem gravações de boa qualidade técnica – basta acompanhar a ficha para se certificar da qualidade da produção e dos profissionais envolvidos – a execução musical aproximava muito uma escola da outra e eliminava a possibilidade das baterias demonstrarem sua criatividade musical e suas características rítmicas mais marcantes junto a letra e a melodia escolhida nas finais de samba, chegando ao disco como o retrato fiel de uma comunidade.
Segundo contam, cada escola terá a possibilidade de levar até quarenta ritmistas para a gravação dos sambas que serão levados para a Avenida em 2010 gerando uma grata oportunidade que possibilitará ao ouvinte o samba “in natura” com a performance energizada das pessoas que compõe seu quadro de ritmistas.
Não acredito que o samba enredo volte a despertar o interesse que um dia despertou no mercado fonográfico e a venda de seus discos volte a atingir as marcas registradas nos anos 70, 80, ou até mesmo 90, quando muitos, pela qualidade musical, ultrapassaram as fronteiras carnavalescas e ganharam gravações antológicas nas vozes de astros da MPB. Hoje, com raras exceções, essa qualidade musical dominada com maestria por bambas como Aluízio Machado, Sillas de Oliveira, Noca da Portela, Helio Turco e Jurandir, transformou-se num jingle de vida efêmera que se apaga junto com as cinzas da quarta-feira.

O LP de Martinho da Vila onde o sambista dedicou reportório a sambas antológicos

Porém, é preciso saudar essa iniciativa que a meu ver demonstra uma alternativa muito positiva para reaquecer o interesse pelo samba feito para desfile. Devolver ao sambista a possibilidade de executar “seu samba” tal como ele é, é um grande passo para o reconhecimento da dedicação com o qual homens e mulheres se entregam a uma causa que não lhes rende retorno financeiro algum.
Nos anos 90, algumas gravações foram feitas ao vivo, sob a lona do Circo Voador. Além do que já fiz correr, gostaria de acrescentar um fato muito curioso e pertinente no universo dos discos de samba-enredo: Quarenta e dois anos estão entre a folia de 1968 e o de 2010, mas o fato de seus carnavais apresentarem discos gravados ao vivo os deixa muito próximos.


A capa do primeiro disco lançado em 1968.

Em 1967, pela primeira vez, foi lançado um disco com os sambas que as Escolas apresentariam no carnaval que se aproximava. Intitulado de “Festival do Samba – Gravado ao vivo”, o “bolachão” trazia as baterias das mais tradicionais agremiações cariocas executando entre cuícas, pastoras, surdos dolentes e tamborins vagarosos, os sambas-enredos do Salgueiro, Mocidade Independente,Império Serrano,Portela, Mangueira, Unidos de Vila Isabel e Unidos de Lucas.
Pela primeira vez, o publico passou a conhecer os sambas que seriam executados no carnaval com antecedência, proporcionando um “boom” comercial que gerou finanças grandiosas de forma que desde então, não há carnaval desacompanhado de disco.
É certo, como já citei, que o interesse pelo “disco dos sambas enredos” muito se perdeu. A vendagem não chega perto do tempo em que o LP era esperado para rodar nas vitrolas que animavam as festas familiares e o fim de cada ano. Muita coisa ocorreu entre o carnaval de 1968 e o que esta para chegar. Entre o primeiro LP e o CD para 2010, estão muitas décadas de transformações que mudaram o carnaval e a historia do samba.
Quando o disco de 2010 estiver em nossas mãos, mas do que o registro ao vivo das baterias de nossas agremiações, estará nele, o registro das transformações do carnaval e a tentativa de que o samba-enredo volte a tocar – pela mãos dos sambistas – o coração dos foliões.



quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Enredo do meu samba!

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Em 1987, aos cinco anos de idade.

Sempre gostei de carnaval e samba. Era muito pequenina e tinha de acompanhar de longe, através das histórias contadas por meu avô, minha avó, meus tios e minha mãe - que narrava suas memórias a cerca do tempo em que era obrigada à desfilar na Estação Primeira de Mangueira. Além deles, era a televisão que trazia para dentro da minha casa, a festa colorida que ocorria na passarela e fazia de mim espectadora assídua dos desfiles das escolas cariocas.
Com o tempo, uma das escolas que acompanhava pela tv, passou a fazer parte da minha vida por preocupação e saudade. Esses sentimentos surgiam na época em que o samba e o trabalho do carnaval tornavam-se ativo na vida de meu pai – nesse periodo diretor de harmonia - e fazia do nome “Acadêmicos do Grande Rio” um conjunto de palavras constantemente repetidos nos assuntos da casa. Foi no seio familiar que descobri, ou melhor, ouvi falar, da escola do qual anos mais tarde feito brincadeira de criança, eu seria integrante.
Para o carnaval de 1993, algumas crianças da minha rua inscreveram-se em alas infantis da agremiação de Caxias. Umas foram deslocadas para a ala das crianças, outras, passista mirins, e eu, baianinha. Nesse carnaval realizei meu primeiro desfile aos 10 anos de idade inaugurando uma nova fase em minha vida. Era naquele universo, na correria das crianças pela quadra, que descobriria uma “infância” que hoje recordo com saudade!

Meu desfile de estréia: No mundo da lua em 1993.

Chegado o carnaval seguinte, a escola não apresentou alas destinadas à crianças, e minha única opção era desfilar como passista mirim. Mesmo envergonhada, em 1994 - no embalo das amigas - cruzei a avenida de passista! No carnaval de 1995 não houve segmento infantil - só o quadro de mestre-sala e porta-bandeira mirins permaneceu como opção. Nesse ano, não desfilei. Lembro-me que a Grande Rio apresentou-se no domingo, e ao lado de uma amiga - a Michele - assisti ao desfile da escola aos prantos pela TV, que àquela altura, não mais transmitia a alegria que eu sabia existir lá. Para amenizar nossa tristeza, meu tio Jorge - que desfilava na Comissão de Frente da escola - nos levou para assistirmos aos desfiles de segunda-feira na Marquês onde a Imperatriz Leopoldinense sagrou-se campeã do carnaval.
No ano seguinte, a escola permaneceu sem a ala de crianças e baianinhas. As opções eram a ala de passistas mirins, ou, conseguir uma vaga no seleto quadro de mestre-sala e porta- bandeira mirim. Como não mais queria ficar de fora, e a vergonha me impedia de repetir a experiência de ser passista, a possibilidade de desfilar carregando uma bandeira passou a povoar minha mente.


Ao lado do meu avô Xango da Magueira.

Para minha sorte, as vagas estavam abertas e o Diretor de Harmonia Candimba - que sabia que eu dançava - comentou com meu pai sobre as vagas disponíveis solicitando que eu fosse à um ensaio.
Nossa! (rs) foi muito engraçado tornar-se uma porta-bandeira. Como não tinha noção de como eram os procedimentos em relação à dança, apareci no ensaio de tênis e bermuda (rs). Não sabia o mínimo e desconhecia que tinha de levar saia e sapato próprio para a dança. Na hora, deram um jeito e algumas meninas antigas da ala me emprestaram o que tinham.Tive dificuldades, ficava tonta, mas com a paciência e o auxilio de pessoas como Jaqueline e Bruna – a segunda, era a 3ª porta- bandeira na época - aprendi muita coisa.
Então, tornei-me porta-bandeira aos 12 anos para em 1996 começar minha trajetória como condutora do pavilhão da escola onde aprendi meu oficio. Este foi o único ano em que o quadro desfilou com 6 casais, meu mestre-sala foi o Eduardo - que me ajudou a ter noção da dança de casal e me incentivou – com quem dancei por 2 anos (1996-1997) para em meu último ano na ala aprediz (1998) fazer par com o Peixinho.


O ultimo ano no quadro mirim.

Nesses três anos de quadro sempre tive o apoio do Sr. Marcos, do Edson e da D.Gina que algumas vezes me indicavam para o Diretor de Carnaval e Vice- Presidente da escola Milton Perácio ( o Pepê para mim ) para substituir a 2ª ou a 3ª porta- bandeira quando elas não podiam estar presentes.
Assim, fui indicada ao lado da Renata – atual segunda porta bandeira da agremiação caxiense - para participar de um concurso fechado para a escolha da 2ª e 3ª porta- bandeira da escola. Só indicação já foi motivo de alegria para mim! O concurso durou 2 meses e no dia 05 de dezembro de 1998 fui escolhida para formar ao lado do Márcio, o 2º casal da escola durante os anos de 1999, 2000 e 2001.
Em maio de 2001 a escola realizou a festa “Os Melhores da Grande Rio” e no final do encontro, para minha surpresa, o Pepê chamou à mim e ao meu pai, para conversar e explicar que eu teria de fazer uma apresentação ao lado do Sidclei – primeiro mestre sala da escola - e que seria nessa apresentação, que o Presidente de honra Jayder Soares e o Presidente Administrativo Helinho de Oliveira iriam decidir se eu poderia me tornar a primeira porta bandeira da escola e atravessar a avenida sendo avaliada pelo júri do carnaval.
A apresentação se deu na festa do sorteio da ordem dos desfiles realizada na quadra da Imperatriz Leopoldinense. Para minha surpresa e alegria fui escolhida, para no carnaval de 2002 fazer minha estréia, aos 19 anos, formando o 1º casal da escola com o mestre-sala Sidclei.


A estreia como primeira porta-bandeira em 2002.

Desde então venho me dedicando à escola e à dança, buscando sempre aprender um pouco mais, me espelhando nas grandes portas- bandeiras que passam, e nas que já passaram pela avenida que virou palco para minhas evoluções. Ali, vivi momentos de grandes alegrias com minha escola, como foi o nosso 3º lugar em 2003, - um sonho para todos os Caxienses que viram a volta da Grande Rio no desfile das campeãs pela 1ª vez – tive meu trabalho reconhecido ao receber premiações - em 2006 e 2009 fui agraciada com o prêmio Tamborim de Ouro do jornal O Dia de melhor casal de mestre- sala e porta- bandeira – e onde, em 2010 me preparo para completar nove anos como guardiã do pavilhão, dedicando-me ao sonho que venho buscando há algum tempo, que é garantir pontuação máxima e soltar o grito de campeã preso na garganta da minha comunidade.

Momentos de concentração para o desfile de 2009.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Começando por Caxias!

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Minha primeira postagem vem dar boas vindas aos que chegam! Mais do que falar exclusivamente sobre mim, o blog quer falar do universo do qual eu faço parte. Espero sugestões para que juntos possamos falar de samba, memória e carnaval. O começo sempre é difícil, e aqui estou eu para dar partida nisso! Mas começar por onde? Pelo que? Eis que me vem a idéia de falar sobre a memória do “meu lugar”.
Todos contam as estórias de seus bairros e comunidades. Muito se fala sobre a ocupação do morro da Mangueira, da vida rural na “velha” Madureira, dos morros da Serrinha, Salgueiro e Macacos! Locais que originaram pólos de irradiação das tradições do samba – pois de lá surgiram respectivamente: Mangueira, Portela, Império Serrano, Salgueiro, e Vila Isabel – essas localidades tem a história da ocupação de seu território fartamente divulgada por contribuírem para o avanço das tradições do samba e do carnaval carioca, ainda no início da construção desse universo.
Seguindo essa linha, venho falar um pouco da história de Duque de Caxias, lugar onde cresci, e descobri as primeiras “lições” do samba. Caxias tem um ponto em comum com a história da ocupação das comunidades que gerariam pólos de cultura do samba: Sua ocupação mais expressiva se dá no contexto das modificações urbanas ocorridas em virtude da implantação da linha férrea, e das reformas urbanísticas do governo Pereira Passos.
Em 1886 era inaugurado o trecho ferroviário que ligava a cidade do Rio de Janeiro à estação de Meriti. Meriti foi a estação que originária anos mais tarde o que seria o embrião do atual município de Duque de Caxias. Povoado que servia apenas como centro de escoamento de umas poucas propriedades rurais que se dedicavam ao fabrico de carvão e à extração de lenha, nos anos que viriam a região começaria a sentir os efeitos da expansão urbana que se anunciava.
Dados estatísticos revelam que em 1910, a população era de 800 pessoas, passando em 1920, para 2920. O rápido crescimento populacional é atribuído ao fato das terras da Baixada servirem para aliviar as pressões demográficas da Cidade do Rio de Janeiro, já prenunciadas no “Bota Baixo” do prefeito Pereira Passos que com suas obras modernizadoras desapropriou a população do centro do Rio forçando-a a ocupar as encostas do morro e as terras que se estendiam ao longo da linha férrea .
“O primeiro loteamento feito em Meriti foi realizado pelo engenheiro Abel Furquim Mendes, que em 1918 dividiu uma área ao longo da via férrea, entre as ruas Pinto Soares e Manoel Reis” … “cujo lotes foram oferecidos a cinqüenta mil réis cada”.
O fracionamento e loteamento das antigas propriedades rurais deram origem aos nossos primeiros bairros. Quem dá partida a esse processo e inaugura esse momento histórico é o bairro da Vila Centenária, de propriedade de D. Francisca Tomé. A seguir, veio o loteamento da Vila Itamarati, de propriedade de Antônio Gonçalves Ferreira Neto, que hoje constitui o bairro Itatiaia e o terceiro loteamento, foi o do Parque Lafaiete.
Com o tempo, apesar da população passar a chamar a localidade de Duque de Caxias - por haver sido descoberto nesta região, o local de nascimento do herói nacional, localizado na fazenda São Paulo, bairro da Taquara - o nome de Merity continuava denominando a estação local. Por Liderança do Dr. Manoel Reis, influente político em “Iguassú”, município ao qual pertencia Merity, foi feito em 1932 um “abaixo-assinado” ao então interventor do estado Dr. Plínio Casado, pedindo “a troca das tabuletas” da antiga estação. O Correio de Iguassú, “vanguardeiro das grandes causas”, assim registrou o “grandioso” evento no dia 22 de maio de 1932. “Apesar de oficializada a nova designação, o nome de Merity continuava no alto da Estação local, causando a mais justa estranheza”. Procurando corrigir essa verdadeira anomalia, o Sr. Jayme Fischer Gambôa entrou em entendimento com os diretores da Companhia, não lhe sendo difícil conseguir aquiescência imediata para a mudança da referida tabuleta.
Em 31 de dezembro de 1943, através do Decreto nº 1055, foi criado o Município de Duque de Caxias, mesmo que, somente em 1947, fora eleito o primeiro prefeito por voto popular, tendo a Câmara Municipal sido instalada no mesmo ano.
Espero ter começado bem, e, mesmo que de maneira breve, ter contribuído para passar adiante um pouco de parte dessa história construída por gente comum, por gente que aqui veio criar raiz, e em 65 anos de existência, transformou Caxias num dos municípios mais importantes do Estado e do País!

Bibliografia: Site da prefeitura de Duque de Caxias/ Ensaio de Guilherme Peres, pesquisador e membro do IPAHB / GOULART (Sílvio, “Correio de Iguassu” nº 59, Nova Iguassu, 1932, RJ),e TORRES (Rogério, “As histórias de machadinho”, Revista Caxias Magazine nº 175, Duque de Caxias,2000, RJ)